MACÁRIO - Duvido sempre. Descreio às vezes. Parece-me que este mundo é um logro. O amor, a glória, a virgindade, tudo é uma ilusão.
O DESCONHECIDO - Tens razão: a virgindade é uma ilusão! Qual é mais virgem, aquela que é deflorada dormindo, ou a freira que, ardente de lágrimas e desejos, se revolve no seu catre, rompendo com as mãos sua roupa de morte, lendo algum romance impuro?
MACÁRIO - Tens razão: a virgindade da alma pode existir numa prostituta e não existir numa virgem de corpo. - Há flores sem perfume, e perfume sem flores. Mas eu não sou como os outros. Acho que uma taça vazia pouco vale, mas não beberia o melhor dos vinhos numa xícara de barro.
O DESCONHECIDO - E contudo bebes o amor nos braços de argila da mulher corrupta!
MACÁRIO - O amor? Que te disse que era o amor? É uma fome impura que se sacia. O corpo faminto é como o conde Ugolino na sua torre - morderia até num cadáver.
O DESCONHECIDO - Tua comparação é exata. A meretriz é um cadáver